segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

O REAL E O IDEAL


Leiria
foto-clemantunes (idealizada com ajuda de Picasa)


O REAL E O IDEAL


Se a distância entre aquilo que de facto existe e acontece e aquilo que achamos que devia ser e acontecer é sempre enorme, há épocas do ano em que o confronto mais intenso com estereótipos muito perfeitos e acabadinhos agudiza a sensação. Como agora.


Porque tudo nos fala de claridade, da harmonia, da amizade e da alegria de estarmos juntos e partilharmos, tendemos a reparar mais nas zonas de escuridão, de conflito, de zanga, de tristeza, de solidão e de abandono que também temos. Tendemos a valorizar o que existe (ou não existe e achamos que devia) que nos afasta dos modelos idealizados. Por qualquer razão, queríamos que a nossa fonte de bem-estar, um bem-estar permanente e duradouro, assentasse de pedra e cal na realidade, em acontecimentos e pessoas exteriores e independentes de nós que, no entanto, cumprissem com exactidão o papel que gostaríamos que desempenhassem.


Por qualquer razão, quase acreditamos que o importante se passa fora, ainda que perto de nós, e que os nossos recursos para lidar com o real são sempre insuficientes.


E, no entanto, trazemos de fabrico uma gama sofisticadíssima de possibilidades. Podemos não só gerir o que acontece à nossa volta, a tal da realidade, como transformá-la em direcção àquilo que nos faz mais sentido ou gostamos mais. Podemos até mudar-nos, aprendendo a olhar sob novas perspectivas e diferentes ângulos.


Claro que já sabemos que, mesmo com diferentes alternativas para fazer com que a realidade seja mais tolerável ou simpática, não conseguimos nunca que aquilo que idealizamos ganhe corpo e se estabeleça. Ainda que consigamos, de vez em quando, experimentar alguma sensação de plenitude, depois ela desfaz-se e desvanece-se.


Parece que é mesmo assim.


Parece que a possibilidade que temos de imaginar o que seria o ideal serve, sobretudo, para nos fazer mover. Para nos pôr a perseguir o sonho, a correr atrás do inalcançável e a ter ganas de manipular a realidade como se fosse o nosso estimado ursinho de peluche.


Os que não percebem isto ficam tristes e sentados a um canto.


O que, em certas alturas, é ainda mais triste.




Isabel Leal
Professora de Psicologia/Psicoterapeuta

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